sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Elogio a mesa de bar - Café e Analgésicos

Por Evandro Cruz

Imagine um ponto de mineração em algum lugar da França do século XVIII, trabalhadores sujos de carvão batem insistentemente contra uma merda de uma pedra que,  dizem, um dia vai se tornar o combustível  que moverá todo o país com seus trens e toda aquela coisa que faz fumaça e carrega outras coisas. Em meio as batidas repetitivas que rasgam os musculos, um trabalhador simples sonha com a tecnologia, no dia em que tudo ficará mais fácil e ele não precisará mais trabalhar tanto.

O sonho do francês fodido na mina de carvão chegou, nós temos tecnologia, nós temos muita tecnologia, a gente já transmite imagens de Marte, isso não é o suprassumo do avanço tecnológico? Mas e o dia em que a gente ia trabalhar menos? Não, esse não chegou, nem nunca vai chegar, na verdade, a tendência é exatamente a inversa.


A esperança de que o avanço tecnológico nos traria uma qualidade de vida melhor ao passo que nos privasse desse martírio diário que é trabalhar caiu por terra há algum tempo, uma das grandes invenções da nossa capacidade inventiva, o smartphone, aparelho que reúne todas as utilidades humanas em um quadrado de  5 por 5, é responsável por aumentar de forma brutal a carga horária de trabalho, uma vez que estamos todos acessíveis a todo momento e a qualquer lugar.

Nossa tecnologia é baseada na performance, carros mais rápidos, telas maiores, celulares com mais funcionalidades, tudo sempre mais, tudo sempre para tornar as coisas mais rápidas e eficazes baseadas na nossa racionalidade ocidental em que todos os aspectos importantes de uma vida são resumidos em calculos em uma tela. E nem o dinheiro vai nos salvar também, aqueles que pretendem ficar obscenamente ricos para depois curtirem a vida, uma má notícia: se você ganhar na loteria, você esta fodido para se livrar de vampiros, se você criar um empreendimento milionário você nunca vai querer parar de trabalhar e se você quiser continuar a ficar rico, vai ter que trabalhar  até o fim dos seus dias.

É mais uma das tendências da modernidade: o dinheiro não nos faz parar de trabalhar, ele deixou de ser uma ferramenta para se tornar um simbolo em si , hoje nós ganhamos dinheiro pelo simples fato de ser necessário ganhar dinheiro. Uma passagem do filme Cosmópolis resume bem o papel do dinheiro em nossos tempos:

"Toda riqueza se transformou em riqueza apenas pela riqueza, e o dinheiro, tendo perdido sua qualidade de narrativa, passou a só falar com ele mesmo."
Mas então, o que fazer? Se a tecnologia nunca irá nos poupar de tanto trabalho, qual é a solução para toda essa desgraça? Solução definitiva parece não haver, mas existem remédios e talvez o maior deles seja pensar além da tecnologia e do dinheiro,  ou pelo menos pensar nas coisas que gostariamos de fazer antes de pensar em tecnologia e dinheiro, você não precisa de um fone de oitocentos reais para ouvir boa música e nem de um carro de 100 mil para fazer uma boa viagem.  A grande solução parcial, mas prazerosa, para a eterna exploração é a boêmia, o fazer por fazer  e o  prazer simples pelo puro prazer.

A cada vez que você senta numa mesa de bar, um pouco do capitalismo se desmorona... ou pelo menos é melhor pensar assim. 


Elogio a mesa de bar - Café e Analgésicos

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