sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Por que o capitalismo está em crise?

Fugindo um pouco dos temas convencionais do blog, mas um assunto de cunho macro e que atinge diretamente o nosso mercado publicitário:

Escrito por: Amilton Aquino e retirado do blog Visão Panorâmica


Antes de responder a esta pergunta, precisamos antes falar de dois princípios básicos essenciais a qualquer empreendimento:

O primeiro é a eficiência. O empreendedor procura tornar seu produto mais atrativo, tanto pela melhoria da qualidade ou pela oferta de um menor preço, deixando ao consumidor a analise final do custo-benefício do seu produto.

O segundo é o equilíbrio nas finanças. Não se deve gastar mais do que se arrecada. Com exceção de alguns momentos cruciais onde a certeza do lucro no futuro compense o risco da obtenção de um financiamento, o objetivo de todo empreendedor é acumular riquezas.

É assim desde sempre. Até mesmo antes do surgimento do capitalismo. Eficiência e equilíbrio nas finanças, portanto, valem tanto para o açougueiro da esquina, quanto para as grandes corporações e governos.

Quando analisamos estes dois princípios de forma macro nos dois séculos de capitalismo, a primeira conclusão é de que o princípio da eficiência foi obtido com louvor, afinal a riqueza gerada desde o século XVIX foi incomparavelmente maior que tudo que havia sido produzido desde os primórdios da humanidade, tornando possível a aquisição de produtos de alto valor agregado inclusive para as classes menos favorecidas.

O problema, portanto, está no segundo princípio: o equilíbrio nas finanças. Endividados sempre existiram, mas foi com o aparecimento dos primeiros ourives (ou seja, muito antes do capitalismo) que começou a se formar um dos “cânceres” da economia atual. Tais ourives foram os primeiros “banqueiros” da história. Se no início eles apenas avaliavam e guardavam o ouro dos seus clientes, aos poucos começaram a emprestar a terceiros, confiando que os verdadeiros donos dos metais preciosos nunca viriam resgatar seus bens todos de uma só vez.

Ao longo da história da humanidade, tal mecanismo foi sendo “aperfeiçoado”. Os ourives, agora com o novo status de banqueiros, passaram a ter cada vez mais influência nos poderes constituídos. E assim foi legalizada a atividade de alavancagem dos bancos, inicialmente definidos na razão de 9/1. Ou seja, os bancos podiam emprestar nove vezes mais que seus depósitos nos bancos centrais. Detalhe: a alavancagem média hoje dos bancos em todo mundo está em torno de 30/1!

Está aí, portanto, uma das razões das instabilidades verificadas no capitalismo desde a crise de 1930. O capitalismo, sob a omissão dos governos, foi transformado em um grande cassino, onde alguns privilegiados banqueiros além de emprestarem dinheiro que não têm, mais recentemente passaram a transformar dívidas (hipotecas) em novos “produtos” de consumo para investidores.

O quadro foi ainda mais agravado quando os EUA começaram a fabricar dólares sem lastro, a partir da década de 60. Por terem o controle da moeda global, o império exportou sua inflação para o mundo e passou a consumir mais do que produzir, acumulando déficits sucessivos ao longo das últimas décadas.

Paralelamente, as grandes empresas, em busca de mais crédito, começaram a abrir seus capitais para investidores. E assim um outro princípio clássico do capitalismo (aquele que aconselha “coloque todos os seus ovos numa cesta, e cuide bem de sua cesta”) foi sendo substituído por “diversifique seus investimentos e não coloque tudo numa única cesta”.

Em outras palavras, milhões de pessoas em todo mundo passaram a delegar a terceiros a responsabilidade de administrarem suas economias em fundos de todos os tipos, muitos criados a partir de dívidas. Com isso, o capitalismo repete, de certa forma, a fracassada experiência comunista, onde os cidadãos abrem mão de sua individualidade repassando ao governo e/ou banqueiros a responsabilidade de administrá-la.

Mas quem melhor que você para zelar por seus bens? Será que um banqueiro tem a mesma preocupação que você ao fazer apostas arriscadas com o seu dinheiro? Será que os governos são tão eficientes na otimização dos recursos que eles não suaram para conquistar?

Em âmbito individual, este novo axioma do capitalismo moderno (a diversificação dos investimentos) traz mais segurança para o investidor, não resta dúvida. O problema é que, em escala global ele contribui para tornar o ambiente econômico mais instável. Daí o comportamento de manada verificado nas bolsas de valores a cada notícia divulgada, principalmente quando tais notícias se referem a algum grande banco.

E aí finalmente chegamos à crise de 2008. Como começou? Com a quebra de um banco norte-americano. A interligação de ativos entre as empresas provocaram uma reação em cadeia que logo chegou a Europa. Passados quatro anos, os EUA esboçam uma reação, enquanto a Europa continua afundada em crise, sem perspectiva de melhora. E por que a Europa sentiu mais a crise?

A resposta nos remete a principal causa da crise do capitalismo atual: o endividamento estatal. Desde meados da década de 70 ficou claro que a Europa teria dificuldades no futuro. Além do acirramento da competição global com a ascensão dos asiáticos que não estão nem aí para o “estado de bem estar social”, os europeus começaram a apresentar déficits nas contas públicas, decorrentes de anos e anos de acúmulos de benefícios sociais que levaram a Europa a se tornar um modelo de capitalismo para os países do antigo terceiro mundo. Além disso, a queda da natalidade e o aumento da expectativa de vida dos europeus provocaram uma explosão de déficits previdenciários. E o que acontece quando os governos têm déficits? Aumento da carga tributária e aumento da dívida pública, já que poucos governantes tem a coragem de aplicar o remédio amargo do liberalismo clássico: o corte de despesas. Aliás, a primeira providência que qualquer cidadão responsável tomaria ao perceber que suas contas entraram no vermelho.

Apesar de algumas tentativas de reduzir os déficits crescentes nas décadas de 80 e 90, os europeus continuaram a emitir títulos de suas dívidas públicas para honrar seus déficits. Portanto, quando a crise financeira iniciada nos EUA atravessou o Atlântico, já pegou os europeus bastante endividados, quadro este que só veio a piorar com os esforços dos governos para estancar o contágio do sistema financeiro.

Mas como arranjar dinheiro quando já estamos endividados? Contraindo mais dívidas a juros mais altos. E assim a Europa entrou num círculo vicioso semelhante ao que os latino-americanos enfrentaram três décadas atrás.

E o que fazer quando estamos endividados? 1) renegociar as dívidas; 2) trabalhar mais; 3) diminuir os gastos; 4) vender algum patrimônio. Estas providências servem para o cidadão comum e para empresas, mas, por razões ideológicas, são contestadas em relação aos Estados. E por que isso acontece?

Desde a crise de 1929, o inglês John Maynard Keynes subverteu a lógica natural do capitalismo ao recomendar o aumento do gasto público para gerar empregos nos momentos de crise.

O raciocínio estaria correto se, após as crises, os governos quitassem os empréstimos contraídos para estimular as economias. Mas, como os governos quase sempre estão mais interessados na permanência no poder que com as futuras gerações, tais dívidas vão se acumulando até chegarem ao ponto em que não dá mais para rolar as dívidas, como é o caso da Grécia, hoje.

Aliás, não só a Grécia. Portugal, Itália e Espanha e França trilham na mesma direção. E o que há em comum entre estas nações? Foram elas quem mais relutaram em fazer reformas “neoliberais” para conter a expansão dos gastos desde os anos 80, quando o modelo de “bem estar social” deu seus primeiros sinais de esgotamento. Será coincidência?

Claro que não. A Grécia, assim como Portugal e Espanha, tiveram anos de rápido progresso quando ingressaram na União Européia. Tiveram tempo suficiente para reformarem seus estados obesos e ineficientes. Mas não aproveitaram os ventos favoráveis (como o Brasil não aproveita agora, vale salientar). Enquanto as nações mais sólidas como a Alemanha, por exemplo, aumentavam a idade mínima de aposentadoria, procuravam otimizar os gastos governamentais e aumentar sua competitividade, os gregos continuavam indiferentes vendo o seu enorme contingente de funcionários públicos (20% da população) se aposentar com todos os privilégios negados a maioria da população.

Apesar de todas estas evidências, os gregos (principalmente os funcionários públicos) ainda relutam em tomar o remédio amargo dos ajustes fiscais necessários para equilibrar as finanças do Estado. Preferem fazer greves e atribuir a culpa aos alemães e ao FMI, que estariam exigindo o sacrifício dos “trabalhadores gregos” com reformas “neoliberais” (qualquer semelhança não é mera coincidência). Entra governo de direita, de esquerda e a novela continua a mesma: a conta não fecha. A situação é tão dramática que mesmo que a dívida grega fosse integralmente perdoada hoje, no dia seguinte eles já estaria contraindo uma nova dívida, pois seus gastos superam as receitas. Uma simples questão de matemática que só pode ser resolvida com redução de gastos, não com discursos.

A lição vai ser dura, mas os gregos, portugueses, italianos, espanhóis (e por extensão os europeus e todas as demais nações que trilham na mesma direção) terão que aprender com sofrimento uma lição básica do capitalismo clássico: o valor do equilíbrio nas finanças públicas.

Diante do que foi exposto acima, podemos resumir então as razões da crise do capitalismo atual em sete itens:

O endividamento dos Estados decorrente de décadas de superposições de políticas keynesianas;
A perda de competitividade dos norte-americanos e europeus em relação aos novos emergentes que contam com vantagens competitivas inerentes ao processo de desenvolvimento, principalmente a mão-de-obra barata e mercados consumidores em expansão;
O sistema de reservas fracionárias dos bancos centrais que permitiu aos bancos emprestarem 30 vezes os valores de seus patrimônios;
O estímulo dos bancos e governos ao crédito fácil, uma armadilha para o endividamento que estimula a economia no presente e cobra a fatura às gerações futuras, como ocorre hoje na Europa e nos EUA;
A omissão dos governos ao permitirem que o sistema financeiro transformasse dívidas em “produtos”;
A migração de parte da população do setor produtivo para a especulação financeira. Muita gente hoje não quer mais trabalhar. Querem viver apenas de “investimentos” ou das benesses do Estado;
A fabricação de dólares sem lastro pelos EUA, o que na prática significa a exportação de inflação para o mundo e o aumento das importações norte-americanas, responsáveis pelos déficits sucessivos nas últimas quatro décadas.

Observe que das sete causas principais, todos são decorrentes de erros de governantes e/ou da ambição humana. Ou seja, não são falhas deste “ente” capitalista que os esquerdistas acostumaram-se a acusar pelas desgraças da humanidade. Aliás, os principais erros (endividamento, perda de competitividade, corrupção) são muito semelhantes aos cometidos pelos líderes socialistas que transformaram o sonho de Marx em pesadelo.

Portanto, não pode existir sistema perfeito se a humanidade não é perfeita. A reforma do capitalismo passa antes pela reforma dos Estados, a curto prazo, e do ser humano, a longo prazo. Os cidadãos das nações em crise devem conscientizar-se de que não dá mais para empurrar as dívidas para as próximas gerações, como seus antecessores fizeram até aqui. Demorou, mas chegou a hora de pagar a conta e aprender, de uma vez por todas, que os Estados não são fontes de riquezas inesgotáveis como os esquerdistas acreditam.

É hora de sepultar de uma vez por todas a guerra ideológica que tanto mal trouxe a humanidade no último século e que, de certa forma, contribuiu para a atual crise do capitalismo. Vai demorar, mas talvez algum dia a humanidade perceba que a ideologia que vale a pena é a ideologia da ética e da moralidade, requisitos essenciais para a boa administração para qualquer instância de poder em qualquer sistema político-econômico, requisitos estes que, infelizmente, têm faltado aos nossos governantes.

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